Apesar do empoderamento feminino ser uma pauta amplamente discutida hoje, artistas ainda enfrentam rincões de machismo na indústria da música.
O empoderamento feminino é uma pauta constante nos dias de hoje, mas ainda podemos escutar muitas frases preconceituosas na boca das pessoas. Grande parte desse preconceito está no ramo musical.
O mundo artístico pode ser um ambiente muito machista, com maioria masculina em muitas áreas – como a musical – e homens ocupando posições de poder em produtoras, gravadoras e estúdios. Muitas mulheres ficam angustiadas e desmotivadas com essa situação, pois percebem que o espaço para elas nessa área é, muitas vezes, pequeno. Mesmo diante de tantos desafios, a presença feminina tem se mostrado cada vez mais forte e poderosa nos últimos anos. Pensando nisso, entrevistei duas mulheres da indústria musical para entender como é a vida nesse meio, e elas contaram sobre alguns desafios e barreiras que superaram para chegar onde estão hoje em dia sem nunca desistir.
A primeira a conversar é a cantora Isabella Almeida – mais conhecida como Mana Bella – de 27 anos, descobriu a paixão pela música dentro de uma igreja e desde então vem perseguindo seu sonho de ser cantora. Nessa entrevista, ela conta sobre alguns dos desafios na área. A segunda é a MC Kelly Neriah, de 35 anos, ela conta que percebeu seu amor pela música aos 10 anos, quando cantava no coral da igreja, e desde então, não parou.
da direita para a esquerda: MC Kelly e Mana Bella
Como é a vida de quem trabalha com música?
MANA BELLA: É difícil, porque antes de começar a ganhar dinheiro com a música, primeiro você tem que perder, quer dizer, não é perder porque a gente tá investindo no nosso futuro, no nosso sonho, mas precisamos de produção, divulgação, gravação. Então eu ainda tenho um trabalho que me mantém e, aos poucos, estou começando a fazer shows com um pequeno retorno financeiro, mas viver só da música eu não consigo. E, infelizmente, a gente sofre inúmeros preconceitos, primeiro por eu ser nordestina, negra, periférica e também por ser mulher, principalmente por estar numa vertente do hip-hop e rap, que é predominantemente masculino. Para você estar nesse meio e ser respeitada, tem que realmente mostrar para o que veio, estar na ativa, sempre lutando, compondo letras combativas dentro do meu lugar de fala (combato o feminicídio, o racismo e a intolerância). Você sempre tem que estar provando que é duas vezes melhor do que o cara que está ao seu lado e que às vezes não está fazendo isso por um sonho, mas sim ganhar dinheiro.
Você sofreu algum tipo de preconceito?
MANA BELLA: Uma vez fui em um evento e na hora que cheguei eu era a única mulher, eles simplesmente me barraram e falaram que não teria público e nem evento, mas independente do público, se for uma ou mil pessoas, o importante é passar a mensagem de resistência.
Como as mulheres são tratadas em geral?
MANA BELLA: As mulheres nesse meio ainda sofrem muito preconceito, as vezes eu chego em eventos e não tenho dj, nem back vocal, então, eu entro com o meu pen drive e percebo os olhares, o apontar de dedo, e isso sempre cai por terra quando subo no palco e mostro para o que eu vim. Isso é o mais importante do que qualquer intriga, eu vim para salvar pessoas, o meu lugar de resposta é em cima do palco, com as minhas letras.
Como você entrou no meio musical?
MC KELLY: Cresci assistindo meu pai e meus tios tocarem moda de viola aos fins de semana nas reuniões de família, mas ingressei na carreira musical aos dezesseis anos, quando meu irmão montou um grupo de rap mirim, me chamaram para fazer um refrão, comecei, então, a ser convidada por vários grupos para fazer freelance. Em 2003, entrei para o grupo de rap Versão Popular, onde faço parte até os dias de hoje conciliando com meu trabalho solo e participações.
Como é a vida de quem trabalha na área música?
MC KELLY: Para nós, que somos do rap, é sempre mais difícil, aqui no Brasil poucos são valorizados, principalmente para nós que somos do anonimato, quando conseguimos algum show pago nós usamos o cachê ou ajuda de custo para investir em mais trabalhos, então, é uma luta constante.
Você sofreu algum tipo de preconceito?
MC KELLY: O preconceito ainda existe, mas já foi pior. Era difícil ser negra, gorda, mulher, mc e da favela, às vezes quando conseguia um emprego, por exemplo, não podia nunca dizer que cantava rap que todos me olhavam com outros olhos, às vezes até comentários infelizes como por exemplo: “Cuidado com a carteira, a Kelly é envolvida com os manos do rap”, ou seja, um preconceito que todos tinham de que quem é do rap é maloqueiro, ladrão ou vagabundo.
Como as mulheres são tratadas no rap?
MC KELLY: Quando comecei, em 1999, mais ou menos, era muito mais difícil para nós, mulheres, não éramos vistas com bons olhos no movimento, até porque praticamente nós tínhamos que usar roupas masculinas, engrossar a voz, falar de cada dez palavras, nove gírias para tentar se inserir no meio e mesmo assim, às vezes, nos colocavam apenas para fazermos um ou outro refrão, não tínhamos muito valor, hoje mudou bastante, mas ainda tem muita coisa pra mudar, podemos ver que em flyer de eventos que sempre tem muito mais homens do que mulheres nas programações… Tem muita mulher com trabalhos ótimos! Mas os caras até quando nos convidam para fazer algum trabalho usam a frase “vou dar uma oportunidade para você que é mulher”, isso já é uma forma de preconceito. Também estamos trabalhando.
Com isso, podemos perceber que mesmo depois de tantos anos de luta, o preconceito ainda está longe de acabar. Mas as mulheres também estão longe de se darem por vencidas.
Para conhecer mais sobre as entrevistadas, visite o perfil delas no instagram:
Essa escritora é incrível
Republicou isso em GRANDE ABC.
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